Autor: Sergio Roberto Meneses de Carvalho
Graduando em Gestão de Polítcas Públicas - EACH USP
RESUMO
Graduando em Gestão de Polítcas Públicas - EACH USP
RESUMO
A
pesquisa a seguir procura elencar propriedades das leis 8666/93, que dispões
sobre os instrumentos de contratos administrativos e a regulamentação das
compras governamentais, e do RDC 12.462/11 que busca alternativas para a
realização destes contratos, com objetivos específicos visando a realização dos
eventos mundiais com sede no Brasil nos anos de 2014 e 2016, além das obras de
infraestrutura necessárias e previstas no Plano de Aceleração do Crescimento.
INTRODUÇÃO
Licitar é desenvolver um ato administrativo, que possa,
através de seus procedimentos pré-definidos possibilitar a conformação de um processo,
este responsável pela formalização legal de um contrato, a viabilizar o
mecanismo pelo qual o Estado irá adquirir produtos ou serviços que permitam a
ele materializar sua função na administração pública. Segundo Pietro, os entes
privados sujeitam-se às diretrizes estabelecidas no processo licitatório, onde,
a administração pública de acordo com o enquadramento, convoca estes para a sua
participação, determinada pela formatação estabelecida no edital de licitação[1].
Para Delgado não há no país uma definição clara do conceito licitação,
conceituando-a como a composição de um procedimento administrativo que finda
com a conformação de um processo administrativo.
Para tal, é necessário o
desenvolvimento de legislação específica para delimitar as funções, obrigações
e direitos dos envolvidos no processo. Com este intuito promulgou-se em 1993 a
Lei 8666/93, normatizando de forma ampla e irrestrita as relações entre as
esferas governamentais e as instituições que de alguma maneira sejam por ela
angariados para a participação na administração pública.
Cabe ressaltar a Constituição
Federal de 1988, em seus arts. 22 XXVII e 37 XXI[2],
o qual institui o modelo de licitação como essencial para as relações comerciais
da administração pública, estabelecidas posteriormente na lei 8666 supracitada.
Em 4 de agosto 2011 a presidente
Dilma Roussef promulga a lei 12462. O País fora escolhido para sediar os Jogos
Olímpicos no ano de 2016 e a Copa do Mundo de 2014. Fazia-se necessário neste
momento, de acordo com a visão da administração pública, modernizar e agilizar
o sistema de contratação de produtos e serviços por parte desta para a
realização dos eventos[3].
Desenvolver-se-á comparativos,
buscando semelhanças e diferenças entre as leis de 1993 e 2011, cabendo uma
análise pragmática e objetiva de forma que seja possível identificar os
principais benefícios ou disfunções da mudança legislativa. Não serão aqui
abordados tópicos específicos, em uma lista item a item, mas sim, buscar-se-á
subtrair da essência das leis propostas suas características principais e as
premissas que as diferenciam e aproximam.
I)
Como parte de um contexto político
de profundas mudanças no cenário brasileiro, ficara deixado para trás a
ditadura militar a oito anos, o governo Sarney com as desventuras econômicas de
Planos Cruzado, uma nova formação política assentava-se sob a custódia da
democracia no país, elegíamos em 1991 um presidente por eleições diretas e
pouco depois o depúnhamos do poder. Do início da década surgia no país a
necessidade de moldar um sistema de administração moderno, baseado na
eficiência do setor público[4].
Itamar Franco promulga em 21 de junho de 1993 a Lei 8666, discrimina assim o
formato de contrato público a ser aderido desta data em diante.
A Lei 8666/93
Logo em seu artigo 1º a 8666 assim
se define – “...normas gerais sobre licitações e contratos administrativos...”
– trazendo consigo não só a esfera federal, mas também alienando os entes
federativos que compõem a união. Referendando a determinação constitucional,
que compete à União a legislar sobre as normas descritas anteriormente[5].
A lei em questão tem como princípios
básicos as garantias constitucionais de isonomia, igualdade de direitos e ampla
concorrência, avalizando o objetivo do “desenvolvimento nacional sustentável”.
A abertura de mercado iniciada na
década vigente era uma válvula de pressão para que o país desenvolvesse uma
legislação própria e detalhada sobre os processos licitatórios. O país mudava a
cada momento sua situação política, a democracia dava seus primeiros passos e o
processo de adequação ao novo status quo
era uma condição primária, exigida pelo mercado globalizado.
Entender as relações da
administração pública, interna e externamente ao seu ambiente era um desafio, o
funcionalismo público tivera sua imagem devastada pelo governo Collor[6],
necessitara de uma base formal e específica para as tratativas comerciais dos
componentes da administração pública com os participantes do processo
licitatório, portanto, também fora incluído no texto da 8666.
A 8666 auxilia a adoção da lei
101/00, a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, o pragmatismo adotado nas
linhas da legislação de 1993 concretam a passagem para um novo estágio
administrativo, possibilitam a adoção de medidas de responsabilização por
gastos excessivos, já determina em seu texto a caracterização orçamentária em
seu art. 14, limitando a caracterização do gasto com a dotação orçamentária
para a sua implementação.
Enfim, modula as formas de participação
no processo licitatório, estabelece prazos, valores, modalidades, trata as
exceções, as dispensas de licitação e estabelece critérios detalhados sobre a
forma de qualificação dos entes privados para a participação nos certames de
licitação.
II)
O Regime Diferenciado de Contratações
Públicas – Lei 12462/11
O país sediará pela primeira vez os
jogos Olímpicos, o evento esportivo mais importante do planeta , atletas de todas as nações virão ao
Brasil, com sede no Rio de Janeiro em 2016 para disputas esportivas. O COI –
Comitê Olímpico Internacional têm como premissa uma série de exigências para
que o país seja sede de uma Olimpíada e Paraolimpíada, com isso há a
necessidade de adequação principalmente infraestrutural para sediar tal evento.
O mesmo ocorre com a realização pela
segunda vez de uma Copa do Mundo de futebol no país, com 12 sedes, espalhadas
pelas 5 regiões do país o evento mobiliza grande monta de investimentos em
infraestrutura para atendimento às boas práticas exigidas pela FIFA.
O governo, verificando a defasagem
estrutural nacional, buscou através da criação de uma regulamentação especial,
dar agilidade ao processo de contratação de serviços e obras de infraestrutura
específicas para estes eventos. Buscou também através desta resolução atender
demandas do Programa de Aceleração do Crescimento, do setor de saúde, do
sistema prisional e excepcionalmente em obras no sistema de ensino.
Há a implementação de algumas
variáveis inovadoras com relação à 8666, o modo de disputa pode ser aberto ou
fechado, da primeira forma é possível a concorrência através de lances, uma
modalidade nova que pode ser lucrativa para o Estado.[7]
A inserção de meios eletrônicos
explícitos no RDC também se trata de uma nova modalidade em comparação,
portanto, busca agilizar o processo concorrencial, garantir a confidencialidade
e a impessoalidade do modelo e possibilitar a utilização física dos meios
eletrônicos para dar agilidade ao processo. Possibilitada também pela criação
de uma pré-qualificação de fornecedores, associada a um sistema de registro de
preços que caracterizam, juntos, a conformação de fornecedores pré-habilitados.
Considerações finais
Um
comparativo das leis 8666 e 12462 pode ser exposto de três formas, sendo, i – havia a possibilidade de se atender
às demandas previstas nos eventos aos quais o país foi eleito como sede nos
anos de 2014 e 2016 sem a implementação do Regime Diferenciado de Contratação? ii – o RDC mantém os princípios básicos
de isonomia, garantia de igualdade de direitos, publicação e da ampla
concorrência? iii – o RDC será, após
a realização dos eventos, um parâmetro para o sistema de contratações da
administração pública?
De posse
das informações coletadas e levantadas, pode-se considerar para a primeira
questão. Há no processo um problema crônico na falta de planejamento temporal
das autoridades nacionais, já que a Copa do Mundo foi definida para o país em
2007, portanto, havia ao menos 6 anos para a realização de toda a
infraestrutura necessária para a realização do evento, caberia desta forma, de
acordo com a lei 8666 tempo útil para a realização dos processos de licitação
nos modelos previstos.
O RDC
encontra marés contrárias, conforme Soares “...o discurso da emergência faz com
que projetos tomem corpo sem passar pelos ritos tradicionais de licitação.”
Concluindo que este tipo de legislação margeia a possibilidade de
superfaturamento através da adição de cláusulas contratuais ao andamento do
processo licitatório e de execução.
O
tangenciamento de sistemas emergenciais de contratação à corrupção e
superfaturamentos é eminente, o país tem um histórico de casos, como o Panamericano
de 2007 no Rio de Janeiro[8].
Para a resposta final à primeira indagação se chega à conclusão que sim.
Necessitaria de um planejamento iniciado em 2007, quando da confirmação do
Brasil como país sede da Copa do Mundo, e em 2009 na candidatura positiva da Olimpíada
e Paraolimpíada de 2016.
Para
responder a segunda indagação é necessário recorrer aos termos da Lei 8666, que
define a isonomia como um ato que possa diferenciar um licitante do outro,
através de características que não sejam as que são tratadas como exceções
nesta lei. Para este aspecto não há no RDC propriedades que possam excluir o
princípio isonômico, apenas há novos dispositivos que podem tornar o sistema
licitatório mais prático e ágil, adotados como procedimentos auxiliares, sendo,
pré-qualificação, cadastramento, sistema de registro de preços e catálogo
eletrônico de padronização.
Sobre a
igualdade de direitos há de se contestar a formação da comissão de licitação,
constante no art. 34. Pois tal conformação de análise oferece a oportunidade de
direcionamento das escolhas através de pressões políticas ou financeiras, seja
por parte do poder político dominante ou pelos candidatos à licitação. Este
modelo de análise fere, por se tratar das passividades já expostas, o critério
da impessoalidade, enfraquece o processo licitatório exatamente por
possibilitar lacunas à análise pessoal de processos administrativos subjugados
por tal comissão.
Em uma
análise geral do RDC, há de se observar algumas evoluções importantes para o
processo licitatório no país, a inclusão no texto da lei de dispositivos
tecnológicos que possam contribuir à agilidade dos processos, o pré-cadastro de
fornecedores, preços e padronização de serviços e produtos, a exigibilidade de
projetos executivos por conta do licitante vencedor, dentre outros. Projetar um
sistema licitatório para o país é uma tarefa complexa, que exige ampla análise
dos dados e resultados obtidos desde a implementação da 8666.
Há de ser
considerada uma evolução no sistema de sanções administrativas, mais rígido,
detalhado e abrangente no RDC. Na aplicação de remuneração variável, que
possibilita administrar inferências pontuais no andamento do contrato, não
esgota imediatamente a disposição de recursos aos licitantes, tal medida, hoje
aplicada com a 8666 pode comprometer o andamento dos serviços contratados.
Em suma, o
RDC foi adotado como uma medida específica para um momento diferenciado do país.
A partir do momento que se aumenta a demanda por infraestrutura, como fruto de
eventos mundiais a serem realizados neste território, tomou-se como medida
necessária pela administração pública a criação de leis específicas, que possam
respaldar juridicamente as ações governamentais.
Porém, há
de se levar em consideração as possibilidades de desvios de conduta, ou a
constante manutenção de planejamentos mal feitos, como se a imprevisibilidade
de eventos ocasionais se tratassem de uma exclusividade brasileira. O RDC
poderia ser estabelecido como uma forma mais moderna, ágil, e que possibilite
um maior controle social sobre o sistema licitatório da administração pública,
é necessário que se colha as informações e lições da aplicação desta
modalidade, de forma a contribuir para a construção de um sistema que não sirva
como base sustentadora de vontades políticas ou como meio esporádico para a
realização de eventos como os que hão de ser realizados no país.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo –
26ª Ed. Atlas. São Paulo, 2013.
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12462.htm - Acesso
em 06/01/2014.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
- Acesso em 06/01/2014.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm - Acesso
em 05/01/2014.
SOARES, Manoel
Montanha; BEHMOIRAS, Daniel Cantanhede; SAMPAIO, Juarez Oliveira. A cidadania
ferida no país da copa: as obras públicas para os mega eventos sob o sorriso do
lagarto. Metrovivência. Ano XXV, nº 41 p. 128-149. Dez/2013. Disponível em https://150.162.1.115/index.php/motrivivencia/article/view/2175-8042.2013v25n41p128/25830 - Acesso em
07/01/2014.
TCU. http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/imprensa/noticias/noticias_arquivos/Pan.doc
– Acesso em 08/01/2014.
UOL Notícias. http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/11/22/aeroporto-do-galeao-e-leiloado-por-r-19-bi-confins-e-arrematado-por-r-182-bi.htm
- Acesso em 07/01/2014.
[1]
PIETRO p. 254.
[2] Art. 22 - XXVII - normas
gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as
administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados,
Distrito Federal e Municípios (...)
Art. 37 - “XXI - ressalvados os casos especificados na
legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante
processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os
concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas
as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá
as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do
cumprimento das obrigações.” – CF. 1988.
[3]
Conforme I, II e III do Art. 1º e I do § 1º.
[4] Como referência havia
a NGP (Nova Gestão Pública), sistema adotado pelos países desenvolvidos, com a
premissa da eficiência do Estado.
[5] A Emenda Constitucional nº. 19/98 deu nova redação ao
artigo 22, XVII, da Constituição Federal, atribuindo à União competência
privativa para legislar sobre “normas gerais de licitação e contratação, em
todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e
fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios...PIETRO p. 254.
[6] O governo de Fernando
Collor de Mello se autodefiniu como “caçador de marajás”.
[7] Nos leilões realizados
no dia 22/11/2013 para concessão dos aeroportos de Confins e Galeão o governo
arrecadou R$ 20,82 bilhões, um ágio de 251% sobre os R$ 5,9 bilhões esperados
inicialmente.
[8] Segundo o Relatório de
Acompanhamento das Ações e Obras relativas ao Panamericano 2007, elaborado pelo
TCU “Os pontos críticos identificados podem ser resumidos na (incapacidade dos
agentes envolvidos de prever, antecipadamente e de forma realista, os
dispêndios necessários à realização de empreendimento desta vanguarda)”
palavras do então Ministro-relator, Marcos Vilaça. (TCU p. 2)